segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O mistério nas pessoas

Já parou para pensar no que as pessoas estão por aí fazendo enquanto você não se faz presente? Eu penso nisso constantemente. Eu ontem lia. Escolhi livro novo na prateleira e pus empenho de 4 horas, pausa de banheiro e água e essa foi minha noite.

Interim. Mal sabia que Amanda chorava por estar sozinha. Carlos, meu primo, admitia seu homossexualismo para os país. Fernando pensava na Larissa, mulher que amei, que pensava em mim, odiando. Minha tia velha queimou o braço na assadeira de bolo, de bolo que sai quentinho, bem molhado. O bolo da Tia velha caiu no chão, pois é castigo que se dá a bolo enervado que machuca tia velha probrezinha. No jornal foi notíciado que Carlos S. Gomes, escritor do livro que lia, morreu. Um amigo meu aprendia uma música no seu piano. Meu tio impotente a anos teve uma ereção no onibus e se desesperou não sabendo como usa-la. Minha irmã sorria das piadas sem graça que seu cachorro lhe fazia. O cachorro olhava minha irma querendo o que querem os cachorros. Cumpadi bebia sua cerveja preta. Um grupo de companheiros da univercidade faziam uma festa, mas nem me convidaram!

Um mundo se realiza no espaço, às vezes, grande, às vezes, pequeno, mas sempre entre: um até logo, e um próximo: olá, como vai?.

No tempo curto entre dois cumprimentos, há toda uma medida colossal. Extensão da minha curiosidade, obviamente. É somente no mágico espaço da alteridade que todos os meus sonhos que projeto se tornam possível para além de mim, e quem sabe até aconteçam realmente para esses os outros. Oi Beatriz! Tudo bem? Ai meu deus, quanto eu não pagava para saber o tudinho do ocorrido com ela desde o nosso último encontro. Vai ver encontrou Dante e nunca saberei...

As pessoas exercem essa atração mágica frente a mim, a do imponderável. É por isso que no muito comum dos dias eu fico sabendo das fofocas inutéis e me inquieto estupefado, puxa porque que tudo isso não acontece comigo? Porque que tudo isso não tem nem pretensão de passar na minha esfera de existência a não ser como fato de outro? A minha vida é um grande tédio, a fora todas as odes e idílios que escuto de um Homero fofoqueiro. Eu ouço das muralhas de troia caindo aos pés do exército grego e fico irremediavelmente maravilhado, como deveria. Não que eu seja uma pessoa que procura saber das fofocas, ou que liga para isso, mas aproveito quando elas chegam até mim já que são o veículo do fantasioso tomando vulto, nome e número de cpf, com direito a detalhes lívidos.

O problema são dois. Primeiro, que a matéria de boa literatura, que são as fofocas dos bons oradores e ainda por cima de estórias altamente comprometedoras, são incontáveis, ou quase, pois se forem não graçam de muita mobilidade. Elas possuem essa certa inércia. Segundo é que nunca ninguém fofoca sobre mim, dái concluo sumariamente eu sou um dos tipos mais vulgares, de vida pacata, que vive, come e morre. Sem grandiosidade qualquer. Sem nem ao menos merecer literatura de uso corrente difamatório: mexerico. A minha vida procura por possuir uma estória, necessáriamente verídica, onde eu, protagonista, seja merecedor de boca alheia. Aí sim encontraria a felicidade. Agora entendo Aquiles e sua decisão.

No entanto, aconteceu algo na minha vida que as pessoas encontrariam uma verdadeiramente volúpia de tomar consciência, mas não conto para ninguém.

Não sei porque, mas não conto.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Amo Guimarães, Diadorim nem se falo!

"Como se amar uma pessoa que não se conheçe?"

Ele morreu e nem projeto eu não tinha de nascer. São trinta e sete anos que nos separam, de morte e de nascença. Ele morreu no auge, eu nasci na baixa. Demorei bem 20 anos para travar contato com ele.

Primeira olhada foi assim. Livro bonito, capa branca, quê diferente!, tem título em cordão vermelho, até que se parece sangue em escorrimento... Grande Sertão: Veredas. Título com dois pontos, marca estilística. Dei bola não. Hoje grasso arrependimento por não ter comprado uma das dez mil edições do homem que amo.

Segundo olhar foi ele que deu, puxou papo, falou me leva, por carinho. Livro capa verde, capa dura, capa viril, de conteúdo, de Cordisburgo. Peguei, nem vi nada, pagava preço e meio mas levava. Barato foi. Livro é barato sempre. Li desde então e então foi a primeira vez que um livro me leu também. A sensação foi inconsolável, devassamento. Que história contei eu para o livro? Sei não, sei que agente se esbarrou de novo.

Ano mais tarde passei na Travessa de Ipanema, minha preferida. Procurei livro de bolso grande para levar em mala maior para viagem distante e sozinha, achei Guimarães. Comprei edição comum porque a bonita já tinha esgotado. Procurei tempo grande edição da bonita, mas gente esperta não esperou e levaram todos antes de mim.
Edição comum, de tinta preta em folha branca, de história linda e forte. Como Diadorim.

Faz problema não. Se não comprei o livro, mas sei que a minha edição está dentro da Biblioteca parisiense François Mitterrand e atende por chamada de aula de menino de 8.551. Entrei quieto, com medo da imensidão de parede em livros, procurei língua mãe português e lá encontrei. Capa branca de preto sujo, cordão vermelho desfiado, igualzinho ao sonho e só minha. Pois tinha a certeza que nem ninguém tinha a lido desde tão. Vê-se-lá francês catar livro português. Vi não, nem ninguém não vê.

Foi assim a conhecença e o pertencimento. Eu sou dele mais que ele de mim. Descobri o Guimarães para mim, tá lá no espaço público da seção voltada para o lusófono, pode ir lá ver, conferir, mas não arreda posse que escaramuça de faca não-afiada há de haver. Número 8.551, têm carimbo local em azul e mais uns outros números de ordem de prateleira cheia que ninguém visita.

Como ama-lo? Sei não que amar é coisa de corpo que não se entende. No livro dele tem corpo meu. Não se entende, se ama. E justo entendimento que se não necessita... Eu sempre procuro a elocução da palavra, as possibilidades de dizer limita em muito a capacidade de viver. Em verdade, viver é narrar desde em contínuo sua própria história, tem vida não sem Palavra, com 'p' grande de importância. Viver são duas perninhas entre o 'a' e o 'z' e tudo tá lá dentro.

Ele amou a palavra, eu a amo também. Amamos os dois ela, palavra: Palavra. Eu busquei sempre em formas complexas disnenarráveis tudo o que ele em palavra fecunda de analfabeto criou. Discerrando abismos da natureza humana em língua de jagunço dia-a-dia. O valor da literatura contra o valor da mente que pensa num mundo sem tanto sentido. E Eu amo a literatura como eu amo a vida como eu amo Guimarães. Guimarães criou Diadorim. Eu amo Guimarães, Diadorim nem se falo.

Diadorim é a mulher da minha vida e para além dela. Mulher de vida-vida foram outras, projeções mesmo das que existiram, e mesmo existência d'outra das projetadas. Eu amei muita mulher longe, pouca mulher perto. Amei muita mulher personagem, personagem de história de vida vivida na narrativa. Amei mulher mãe, mulher irmã. Amei mulher fatal. Amei mulher bonita que só. Mas nunca que amei amiga não. Quero amar mulher amiga, de se conhecer desde antanho estórinhas partilhadas em segredo de noite. De saber minúscias de mão em cabelo e sorriso bobo de sem-graça. De amar amando sem entender...

Reinaldo é mulher forte, corajosa. Herói, heroína dos meus sonhos, do meu livro. Do corpo no livro. Beleza de olhos verde, esmeraldadinhas. Pois vou eu amando ela enquanto minha Diadorim não me bate à porta e diz: Cheguei.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

As vezes um cachimbo é só um cachimbo.

Isto é Tomas. Tomas é um homem. Tomas tem um cerébro que ainda irá ser utilizado para duas coisas. Deixo a vocês a caracterização de Tomas, porque Tomas é qualquer um. Um homem genérico, não em específico. Ele não existe e nunca existirá, salvo nesse escrito. Portanto pouca importância há em saber como ele era, a cor dos cabelos ou a raiz de suas crenças. Ele ganhou esse nome porque acabo de ler um livro em que um personagem Tomas, em específico mesmo sem existir, me marcou muito.

Isto é a carta que Tomas escreve. Tomas usa seu cerébro para escrever a carta. Tomas vai se suicidar e Tomas vai deixar ao mundo suas últimas palavras. A carta mesmo tem pouca importância, pois que importância teria o último gesto altruísta de um homem egoísta, pura demagogia. Não nós interessa. Tomas escreve um carta porque eu amo escrever e sempre senti uma afetação muito grande pelos motivos que levam uma pessoa a escrever uma carta. Receber uma carta me marcaria muito. Eu nunca recebi uma carta.

Isto é um revólver. Funciona apertanto uma espécie de alavanca que por um mecanismo intrincado acaba dispondo um pequeno pedaço de ferro no cerébro de Tomas. Tomas usa seu cerébro pela última vez. Tomas é morto. Muitos homens morrem, Tomas é um morto espécifico mesmo tendo sido um vivo genérico. A morte de Tomas nós interessa. Morrer me marcaria muito.

Isto é um cachimbo. O avô de Tomas sempre fumou. O avó de Tomas se suicidou. Tomas vem de uma família de suicídas. O pai de Tomas só não se suicidou porque morreu atropelado, um carro o econtrou primeiro. Ou vai ver foi suicídio. O pai de Tomas era filosófo. Eu adoraria ser filósofo, não ser filósofo me marcou muito.

Isto não é um cachimbo. É a imagem de um cachimbo. Magritte, um pintor, pintou a imagem de um cachimbo, e mesmo sem ser filosófo, filosofou em cima da imagem do cachimbo que não é um cachimbo. O pai de Tomas que era filosófo, mas não pintor, um dia discursou para Tomas sobre o que um cachimbo poderia ser além de cachimbo. A vida de Tomas foi marcada pela traição da imagem do cachimbo.

As vezes um cachimbo não é um cachimbo. No mais das vezes, tudo é algo mais do que aparenta. Ver com os olhos que vêem cachimbo é muito fácil, difícil mesmo é ver com os olhos que vêem o que o cachimbo esconde. Procurar por trás das aparências é o dever de um filosófo. A vida é vasta e as metáforas são perigosas. As metáforas são o que tornam o cachimbo em outra coisa, elas fazem ser o que é em algo totalmente outro. Eu procuro a verdade das metáforas na filosofia e na literatura. Tomas procurou a verdade no cano do revólver, eu ainda quero usar meu cerébro para outras coisas. A vida é muito besta sem as metáforas, eu as procuro para encontrar sabor, mesmo sendo perigoso. Minha vida foi marca pela procura incessante da verdade por de trás do véu que esconde o cachimbo que não é cachimbo, metáforas.

E por que a morte de Tomas nós interessa? Porque a morte de Tomas é só a morte de Tomas, nada por detrás disso. Sem metáfora, sem alegoria. As vezes um cachimbo é só um cachimbo. Ele decidiu não mais viver e que não há mal nenhum nessa decisão. Para mim todas as pessoas são marcadas de idiotas se por ao menos uma vez elas não pensaram na hipótese de suicício.

Isto é um texto. O texto aparenta dizer algo sobre Tomas mas na verdade diz tudo sobre mim. Esse texto não é só um texto. Esse texto é uma metáfora sobre mim.

Fecha o véu, acaba a metáfora, termina o texto.