terça-feira, 2 de março de 2010

Carrousel

(*Antes de se ler o autor obriga certa imposição, a saber: para se ler ouvindo 'Elephant Gun' do 'Beirut'. Isso não é um texto, quem sabe uma obra plástica? http://www.youtube.com/watch?v=bYmaGvexazI )

Mundo gira, gira ele, gira eu. Eu no meu cavalinho, você no seu.

Corria desesperadamente até você, eterna corrida. Estática, porém giravamos. Você parada na minha frente e eu girando, perseguindo. Vindo logo atrás a música. Giravamos nós, girava a música. Loucamente. Seus cabelos cachinhos pretos, balançando, e seu cavalinho galopava. Um mar em ressaca, negro, à chacoalhadas. Capitu. Você era a minha Capitolina.

Pequenas e sutis olhadas para trás. Olhar de cigana obliqua e dissimulada. Vendo o seu perseguidor. Olhos se cruzando e o caminho, não. Olhos negros. Te cercando, esperando, correndo. Eu pronto para dar o bote, mas o cavalinho, tão lerdinho. Nem chegava perto, mas também não se afastava. Tântalo. Eu era seu Tântalo.

Tão perto e, ainda assim, tão longe.

No entanto, meu cavalinho não perdia o pique e nem eu minha esperança. E você, tão maldosa, me nutrindo um sonho doce, uma roda viva, sempre a olhar. Maldição! Nem havia me percebido, mas esse paspalho aqui do lado corre também atrás dela. Dentuço, ainda bem que o pangarezinho dele não corre muito. Agora eramos dois perseguidores, eramos antes também, mas só me dera conta dele por agora. Por que por de trás dessas lindas meninas de saias rodadas sempre alguém cavalga? Por que sempre alguém cavalga? Por que alguém? Por que sempre? Por que cavalga? Mas eu bem que sabia o porquê da saia rodada. Porque linda.

Forças incomensuráveis no açoite ao lombo duro do pobrecoitado e ele, impassível. Nem relinchava, o mudo. Derramam água sanitária na música, ela alvejava. Vai baixando e o cavalinho cansando. Sorte, o dela também. Dessa vez eu pego. Pego o que? Percebo que correr é que é fácil, difícil mesmo é pegar. Mas pegar o que? A música quase surda, imperceptivel. Chegando lá, vou e pego tudo, isso sim. Corri para não pegar? E os cavalinhos param. Pego tudo. Ela desce, a saia faz o som de frufru, e o paspalho corre para um sorveteiro, paspalho. Pego o que? O paspalho foi e pegou pelo menos um sorvete, e eu, pego o que? Ela parada ao lado do cavalo exausto, olhando para mim. Será que ela quer que eu pegue?

Nem todos os sorvetes do mundo me encheriam o vazio do estomago angústiado que eu tinha ao andar na sua direção. Ela olhando. Que profundeza num olhar. Percebia as bochechas róseas de certa graça embaraçada, isso mesmo, ela quer que eu pegue. Mas o que? De que jeito? Desejei ouvir a música alegre que tocava, pelo menos ela me enchia de algo que não desse vazio apertado. Quem me dera estar no cavalinho, só correndo. Mais fácil. Comunhão dos atros, encontro das órbitas, eclipse das faces. Bem de pertinho. Que cheiro gostoso que ela tem.

Ninguém nada fala, não. Um sorriso me é aberto, eu retribuo bem envergonhado. É para pegar, fato! Pego, ou não? Aquilo ou isso? Me decido em pegar, na verdade estava decidido desde o arreio do cavalinho mas agora enrolava que era por medo de não saber bem o que pegar...

Bom, por final basta saber que no meu primeiro passeio de carrousel eu acabei pegando mesmo foi a mão dela. Sai triunfal, esnobando o próposito alcançado para o paspalhudo que só tinha pego o sorvete.

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